Corria um qualquer ano, a seguir a um outro qualquer ano que antes tinha passado e antes do outro ano que estava para vir. Estavam despidas as árvores, de folhas, de ideais, as pessoas, talvez. Do inverno que ainda não estava, só havia o outono que já brotava frieza. A aspereza do clima contrastava com a temperatura das ideias daquele tempo, tão quentes e nítidas para uns, tão frias e desbotadas para outros. Confusas, consequentemente, em actos por todos e traduzidas na linguagem do comportamentos nos dias que se seguem aos dias, puxados pela corrente da alvorada dos sóis que nascem e pelas luas que os precedem. Eram assim aqueles tempos, tão cheios de tanta coisa, tão vazios de tudo.
A indiferença para com o tempo espalhou-se como se espalha o sangue pelas veias, não foi contudo sempre assim. Serviam-lhe em si ainda todos os sonhos do mundo, já não porém o casaco que os veste. Com a constatação de tal, Jeremias vivia a frugal existência dos que tudo têm e nada precisam. Noutro tempo, talvez tivesse sido diferente. Noutro tempo foi diferente. Jeremias mete-se então ao caminho e segue em frente sem a hesitação dos que sabem o caminho.